Elaborado por: Dra. Marta Leite
Pneumologista Clínica do Grupo de Circulação Pulmonar do Hospital Português
Colaboração: Dr. Iury Melo;Dr. Fábio Solano; Dr. Marcelo Goltchild
A hipertensão pulmonar tromboembólica crônica (HPTEC) é uma forma de hipertensão pulmonar (HP) que advém da oclusão de segmentos da circulação arterial pulmonar por material tromboembólico residual organizado, com consequente remodelamento da microvasculatura pulmonar, induzido ou potencializado por uma combinação de angiogênese imperfeita, fibrinólise endógena reduzida e disfunção endotelial. Nesse processo, há a substituição gradativa da camada íntima endotelial normal, com redução do leito vascular pulmonar e consequente elevação de sua resistência e, portanto, da pós-carga do ventrículo direito. Essa elevação da carga imposta ao ventrículo direito leva a progressiva insuficiência ventricular direita, principal responsável pela mortalidade associada à doença. A definição de HPTEC se faz através de critérios objetivos .Os critérios diagnósticos visam excluir um potencial componente relacionado a material embólico agudo (por isso há a necessidade de ao menos três meses de anticoagulação plena), confirmar a oclusão por métodos de imagem e, por fim, confirmar a presença de HP.
A HPTEC pertence ao grupo 4 na atual classificação de HP e sua classificação adequada é de suma importância porque a condução terapêutica de HPTEC é completamente distinta da de outras formas de HP, uma vez que inclui a possibilidade de tratamento cirúrgico ( Tromboendarterectomia), com potencial cura da doença.
Em torno de 80% dos casos de HPTEC, a doença é antecedida por um episódio identificado de tromboembolismo pulmonar (TEP) agudo. Após um episódio de TEP agudo pode-se ter três desfechos clínicos possíveis:
1) insuficiência ventricular direita por elevação aguda da pós-carga do ventrículo direito, podendo levar ao óbito;
2) reperfusão completa da circulação pulmonar a médio prazo, que pode ser espontânea (decorrente da ação de trombolíticos endógenos) ou secundária ao tratamento;
3) reperfusão parcial da circulação pulmonar, com oclusão residual de parte da circulação pulmonar.
Acredita-se que após um ano do episódio de TEP agudo adequadamente tratado com anticoagulantes, aproximadamente 30% dos pacientes permaneçam com alguma falha de enchimento na circulação pulmonar quando reavaliados por meio de cintilografia pulmonar de inalação/perfusão, e uma parcela deles será de sintomáticos. Pacientes com defeitos perfusionais após um episódio de embolia pulmonar aguda que persistem com dispneia, mas sem HP ao repouso, são portadores de doença pulmonar tromboembólica crônica (DPTC). Nesse grupo, os sintomas são decorrentes da HP ao esforço e/ou por alterações ventilatórias e de trocas gasosas. Já a parcela de pacientes com defeitos perfusionais residuais, com sintomas mais relevantes, e com HP caracterizam a população de portadores de HPTEC. Diferentemente dos pacientes com DPTC, pacientes com HPTEC apresentam uma disfunção hemodinâmica acentuada e padecem não apenas por conta do território vascular hipoperfundido (pela oclusão arterial pulmonar crônica), mas também pelas regiões pulmonares livres de coágulo, submetidas à hiperfluxo relativo, frente ao fluxo sanguíneo desviado das regiões obstruídas. Além disso, especula-se que a circulação brônquica, cujo fluxo está aumentado nesses casos, também possa promover uma acentuação desse hiperfluxo no leito vascular distal à obstrução, pela presença de circulação colateral. Esse hiperfluxo acarreta disfunção endotelial, com consequente remodelamento vascular. Como resultante dessa situação hipoperfusão/ hiperfluxo regional, em pacientes suscetíveis, surgem a HP e a insuficiência ventricular direita subsequente. Portanto, a disfunção endotelial da HPTEC não é encontrada apenas no território arterial pulmonar, mas também no território capilar e venoso. Tal fato poderia explicar porque uma parcela considerável dos pacientes permanece com HP residual após a realização de tromboendarterectomia pulmonar (TEAP).
Ainda que a TEAP seja o tratamento de escolha, estima-se que um terço dos pacientes com HPTEC não recebe indicação de tratamento cirúrgico e 30% dos indivíduos operados apresentam HP residual no pós-operatório. Esse grupo de pacientes se beneficiará do tratamento medicamentoso e da angioplastia arterial pulmonar por balão (APB). A escolha do tratamento depende sobretudo da localização das lesões. Pacientes com acometimento mais proximais serão candidatos à cirurgia, enquanto aqueles cujo predomínio seja de lesões distais ou microvasculares se beneficiarão do tratamento clínico e ou da angioplastia arterial pulmonar por balão. Atualmente, o Riociguate é a única droga aprovada pelas agências reguladoras americana, europeia e brasileira. Importante frisar que a definição da terapêutica adequada deverá ser realizada em centro de referência por equipe multidisciplinar.