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ProAr

O ProAR e a Pneumologia da Bahia

Introdução e Resumo

O Programa para o Controle da Asma na Bahia (ProAR), foi fundado em 2003 na Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA), sobre os pilares sólidos do Departamento de Medicina e da pneumologia, contando com a influência positiva dos discípulos do Professor César de Araújo, os Professores Antônio Carlos Peçanha Martins, meu inesquecível mestre e amigo, e do Professor Almério Machado. Foi muito importante também o apoio do Professor Jorge Pereira, que nos levou ao então Prefeito Antônio Imbassahy, de quem conseguimos a contratação de dois médicos em 2003 para iniciar os atendimentos com segurança de continuidade. Merecem destaque adicional o apoio dos Professores José Tavares Neto e Lorene Pinto, ex-diretores da Faculdade de Medicina da UFBA, do Professor Luís Eugênio Portela de Souza, Ex-Secretário de Saúde de Salvador, que nos cedeu um andar inteiro do Centro de Saúde Carlos Gomes em 2006. As principais lideranças que construíram os passos iniciais do projeto ao meu lado são também pneumologistas destacados: a Dra. Rosana Franco e o Professor Eduardo Ponte. Devo louvar especialmente a atuação do Professor Adelmir Machado, também pneumologista, meu ex-aluno e amigo querido, que coordena o ProAR desde 2006, com proficiência e determinação para enfrentar as adversidades da falta de prioridade no SUS.


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Membros da equipe do ProAR na Celebração do seu 5º aniversário, em 2007,
na Faculdade de Medicina da Bahia, UFBA.


Trata-se de uma experiência inovadora autossustentável de tradução de conhecimento em melhores práticas para uma doença muito frequente que não recebe prioridade no SUS. Contribui há 18 anos para o controle da ASMA na Bahia. Oferecendo tratamento gratuito reduziu em 74% as hospitalizações em Salvador. Foi criado por alunos de pós-graduação da UFBA sob a nossa liderança, com a visão de um mundo onde todos respirem livremente e os seguintes objetivos: a) Constituição de centros de referência para o tratamento da ASMA grave no SUS; b) Treinamento de profissionais para o cuidado da ASMA; c) Geração de conhecimento relevante. Foi reconhecido pela OMS como modelo para países em desenvolvimento [1]. Os fundadores investiram seu tempo em caráter voluntário, obtendo apoio da UFBA, do Ministério da Saúde (MS), das secretarias estadual (SESAB) e municipal de saúde (SMS), da FAPESB e do CNPq. Seus objetivos foram atingidos [2] e o ProAR foi reconhecido como um Centro de Excelência em ASMA (CNPq PRONEX) [3], obtendo também financiamento para pesquisa de outros países. Hoje o ProAR cresceu e foi transformado em Fundação (Fundação ProAR – www.fundacaoproar.org.br ), criada para expandir as nossas iniciativas em colaboração com colegas da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Grupo BraSA.

Breve História do ProAR

A prevalência de ASMA no Brasil é uma das mais altas do mundo. Estudos com nossa participação, indicaram que 23% dos brasileiros adultos têm sintomas, mas apenas 12% têm diagnóstico de ASMA – inquérito da OMS [4], proporção confirmada entre adolescentes – inquérito do MS [5]. Até 2002 não havia disponibilidade de tratamento para a ASMA no SUS. Os pacientes eram atendidos durante ataques de ASMA em serviços de emergência e tinham alta sem alternativa para prevenir novos ataques. Elaboramos uma proposta para atenuar o problema: o ProAR, cuja minuta foi encaminhada para apreciação de sociedades médicas, Ministério da Saúde (MS) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB) com solicitação de financiamento. Em seguida o MS publicou uma portaria [6] em que assegurava o acesso de pacientes com ASMA grave, tal como havíamos proposto, a uma combinação de broncodilatador de longa ação e um corticosteroide inalado. Foi com o respaldo dessa portaria e recursos da FAPESB que iniciamos o ProAR, reunindo alunos de pós-graduação da UFBA sob nossa orientação: Adelmir Machado, Eduardo Ponte e Rosana Franco, médicos; Carolina Machado, enfermeira; Pablo Moura Santos, farmacêutico; e Ana Tereza Campos, administradora; oferecendo atendimento multidisciplinar gratuito a pacientes com ASMA grave. Sob a nossa liderança, com a visão de um mundo onde todos pudessem respirar livremente, o ProAR teve como objetivos: 1) Constituição de centros de referência para o tratamento da ASMA grave no SUS; 2) Treinamento de profissionais para o cuidado da ASMA; 3) Geração de conhecimento relevante. Tiveram um papel destacado na etapa inicial: Rosana, Eduardo e Carolina, contando com apoio de outros profissionais contratados pelo SUS. Criamos 4 ambulatórios de referência em Salvador e um em Feira de Santana a partir de 2003. Nos 3 primeiros anos, 1.895 pacientes com asma grave foram atendidos, números que ultrapassaram os 3.000 a partir de 2010. Em 5 anos foram treinados 514 profissionais de saúde de todo o Estado. Entre 2006 e 2008, fomos convidados a trabalhar diretamente para a Organização Mundial da Saúde (OMS) em Genebra, coordenando ações para o controle de doenças respiratórias globalmente [7] e o Dr. Adelmir Machado assumiu a coordenação do ProAR. A partir de 2009, encerrado nosso trabalho na OMS, passamos a integrar o Conselho Diretor da Iniciativa Global Contra a Asma (GINA) [8], mas retornamos a Salvador e demos continuidade ao trabalho no ProAR apoiando o novo Coordenador.

O Tamanho do Desafio

No ano de 2013, houve 129.728 internações e 2.047 mortes por ASMA no Brasil [9]. As hospitalizações e a taxa de mortalidade estão diminuindo com o maior acesso ao tratamento, mas o número total de mortes permanece acima de 2.000 por ano e há flagrantes desigualdades, especialmente na Região Nordeste, conforme revelaram estudos nossos [10,11]. O custo da ASMA grave em Salvador compromete mais de 1/4 da renda familiar, podendo ser reduzido com o tratamento adequado [12]. Pacientes atendidos em Unidades de Pronto Atendimento por exacerbações não têm acompanhamento em unidades de saúde da família, nem conseguem agendar consultas especializadas, permanecendo sintomáticos e sob risco de recorrência de ataques. A falta de controle da ASMA em nosso Estado e a inexistência de um plano de ação do SUS para o problema, nos ofereceu a oportunidade para intervir em três frentes distintas interligadas: assistência, ensino e investigação. Não havia recursos financeiros, recursos humanos nem instalações garantidas. Conquistamos cada um destes meios para atingir nosso objetivo de ajudar as pessoas com asma a respirar livremente. Demos prioridade aos pacientes com ASMA grave, com fornecimento de medicações gratuitas, de segunda a sexta-feira, ao tempo em que realizávamos treinamentos de profissionais de saúde aos sábados e desenvolvíamos pesquisa. O primeiro artigo sobre o impacto do programa reportou uma redução de 90% nas hospitalizações por asma entre pacientes acompanhados no ProAR [13]. Três anos depois do seu início, avaliando hospitalizações por ASMA no SUS em toda a população de Salvador detectamos 74% de redução [14]. A sólida formação acadêmica e a dedicação dos nossos ex-alunos do ProAR os levou a posições de destaque em todo Brasil: Adelmir Machado, Professor Associado e Diretor do Instituto de Ciência da Saúde da UFBA; Carolina Machado, Professora Adjunta e Diretora da Escola de Enfermagem da UFBA; Ana Carla Coelho, Coordenadora do Curso de Enfermagem da UFBA; Rosana Franco, Presidente da Sociedade de Pneumologia da Bahia; Eduardo Ponte, Chefe do Departamento de Medicina da Faculdade de Jundiaí; Sílvia Simões, Professora Associada da UFSE; Heli Brandão, Professora da UEFS; Luane Mello, Professora da USP-RP; Aline Lima-Matos, Coordenadora do Curso de Farmácia da FTC de Jequié; Pablo Moura Santos, Professor Adjunto da Faculdade de Farmácia da UFBA, Jamille Fernandes, Professora Adjunta da UFOB e Andréia Fernandes, Docente da UNIEURO.

Inovando para Traduzir Conhecimento em Melhores Práticas

O ProAR é uma experiência inovadora autossustentável de tradução de conhecimento em melhores práticas para uma doença que não recebe a devida prioridade no SUS, em ação multifacetada num cenário complexo. Desejávamos controlar a ASMA, que afeta 20 milhões de brasileiros, uma das principais causas de atendimento de emergência e hospitalizações, com sofrimento recorrente e mortes. Pacientes enfrentam longa jornada para obter diagnóstico e tratamento, ainda não disponibilizado quando foi concebido o ProAR (2002). Planejamos atuar no atendimento dos casos graves, em centros de referência, enquanto treinávamos profissionais da atenção primária, com a hipótese de que isto nos permitiria trazer benefício no plano individual e no plano coletivo. Enquanto a criação dos centros de referência foi bem sucedida, a capacitação da atenção básica não teve o alcance desejado por falta de prioridade do SUS naquela época e pela acesso limitado ao tratamento. De qualquer forma, obtivemos uma rápida redução em visitas de emergência e hospitalizações, conforme referido na secção anterior e retomamos a atividade de capacitação. Atendíamos adultos e crianças em 5 ambulatórios, no Hospital Universitário (HU), no H. Santa Isabel, no H. Octávio Mangabeira e em Feira de Santana. Em 2006 a Central de Referência do ProAR foi transferida do HU para o Centro de Saúde Carlos Gomes, da SMS, onde foi montado o Centro de Excelência com financiamento do CNPq. Fazemos parte do Projeto SCAALA, em colaboração com o Prof. Maurício Barreto [Wellcome Trust]; conduzimos o estudo caso-controle “Fatores de Risco, Endofenótipos e Biomarcadores da ASMA Grave”, complementado por caracterização de pacientes que respondem mal ao tratamento [CNPq]; estudo internacional de fenótipos de ASMA (WASP) liderado pelo Prof. Neil Pierce (UK); o Projeto ATTACK em colaboração com o Prof. Philip Cooper (UK) [NIHR]; estudos de genética na ASMA com a Profa. Camila Figueiredo (UFBA) e a Profa. Kathleen Barnes (EUA) [NIH]; estudo de uma estratégia de capacitação (PACK) de profissionais da saúde da família, em colaboração com os Prof. Eric Bateman (África do Sul) e Rafael Stelmach (USP); e desenvolvemos colaborações diversas com o Prof. Paulo Camargos e a Profa. Laura Lasmar (UFMG). Uma avaliação dos principais experts em asma do Brasil realizada por organização internacional, lista mais de uma dezena de líderes do ProAR ou nossos colaboradores diretos [15].

 

 

 

 

 

 

Membros da equipe de pesquisadores do ProAR reunidos em seminário em 2019.

Resultados Principais

Os resultados superaram as nossas expectativas. A combinação de assistência, ensino e pesquisa fora dos muros da universidade contribuiu para uma informalidade criativa. Em cada um de nós viceja o desejo de honrar as tradições baianas de grandes médicos e cientistas, do passado e do presente (tivemos o privilégio de ter o Prof. Edgar Carvalho como nosso orientador e de conviver de perto com o Prof. Manoel Barral), ao tempo em que buscamos inspiração na obra de conterrâneos imortais que viveram para servir: Santa Dulce e Divaldo Franco. Resumimos aqui os resultados relacionados aos objetivos iniciais: a) Centros de referência – os centros em Salvador e Feira de Santana (nesta cidade com Dra. Heli Brandão e Dr. Ivan Silva Jr), tem funcionado nos últimos 16 anos com redução das hospitalizações por asma em ambas as cidades [14,16]. Em Salvador, os principais polos são o ambulatório de ASMA do Hospital Octávio Mangabeira e a Central de Referência (Centro de Saúde Carlos Gomes) hospedada pela SMS. Em 2018 foram realizados 11.421 atendimentos na Central de Referência; b) Treinamento de profissionais – o treinamento intenso do início do projeto foi retomado em 2018 na UFBA (liderado pelo Dr. Adelmir Machado) e nas unidades da SMS, sob a nossa responsabilidade. Recebemos regularmente estudantes de graduação da UFBA e de outras universidades do Estado. No entanto, a nossa atividade mais intensa é na pós-graduação, onde orientamos mestrandos e doutorandos, utilizando informações obtidas no ProAR (66 teses ou dissertações e mais 6 alunos de pós-doutorado); c) Geração de conhecimento – a atividade de pesquisa é a nossa principal fonte de recursos (agências públicas nacionais, internacionais e doadores privados) e gera numerosas publicações [2]. Consideramos que a principal contribuição do ProAR para o conhecimento até o momento foi demostrar que é possível controlar a ASMA em população da baixa renda, reduzindo rapidamente visitas de emergência e internamentos com o acompanhamento em centros de referência em nível secundário e acesso a medicação adequada [14], com cenário ideal de custo-efetividade comprovado: melhores resultados com menores custos [17]. Hoje o ProAR cresceu e foi transformado em Fundação (Fundação ProAR – www.fundacaoproar.org.br ), criada para expandir as nossas iniciativas em colaboração com colegas da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Grupo BraSA.


Referências Bibliográficas

1. World Health Organization. Global Alliance against Chronic Respiratory Diseases (GARD) – Countries. Último acesso em 20.10.2019. [https://www.who.int/gard/countries/demonstration_project_bahia/en/]
2. US National Library of Medicine. Alvaro A. Cruz – My Bibliography. Último acesso em 20.10.2019. [https://www.ncbi.nlm.nih.gov/myncbi/18w03o-N6jawhr/bibliography/public/]
3. CNPq – Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. Programa de Apoio aos Núcleos de Excelência – PRONEX. Último acesso em 20.10.2019. [http://www.cnpq.br/web/guest/pronex]
4. To T, Stanojevic S, Moores G, Gershon AS, Bateman ED, Cruz AA, Boulet LP. Global asthma prevalence in adults: findings from the cross-sectional world health survey. BMC Public Health. 2012 Mar 19;12:204.
[https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/22429515]
5. Barreto ML, Ribeiro-Silva Rde C, Malta DC, Oliveira-Campos M, Andreazzi MA, Cruz AA. Prevalence of asthma symptoms among adolescents in Brazil: National Adolescent School-based Health Survey (PeNSE 2012). Rev Bras Epidemiol. 2014;17Suppl 1:106-15.
[https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25054257]
6. Brasil, Ministério da Saúde apud Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Último acesso em 20.10.2019. [http://www.itarget.com.br/newclients/sppt.org.br/2010/extra/download/protocolo_asma.pdf]
7. World Health Organization. Global Alliance against Chronic Respiratory Diseases (GARD). Set of suggestions for GARD Country. Último acesso em 20.10.2019.
[http://www10.who.int/gard/news_events/1_cruz_set_suggestions_gard_country.pdf]
8. Global Initiative for asthma. Board of Directors. Último acesso em 20.10.2019.
[https://ginasthma.org/about-us/board-of-directors/]
9. Cardoso TA, Roncada C, Silva ERD, Pinto LA, Jones MH, Stein RT, Pitrez PM. The
impact of asthma in Brazil: a longitudinal analysis of data from a Brazilian national database system. J Bras Pneumol. 2017 May-Jun;43(3):163-168.
[https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28746526]
10. de Souza-Machado C, Souza-Machado A, Cruz AA. Asthma mortality inequalities in Brazil: tolerating the unbearable. ScientificWorldJournal. 2012;2012:625829.
[https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3354422/]
11. Ponte EV, Cruz AA, Athanazio R, Carvalho-Pinto R, Fernandes FLA, Barreto ML,
 
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Telefone: 71 99974-4371
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